Ei. Olha para mim. Agora olhe para essas palavras, você que me lê. Agora esqueça tudo isso...olhe para você. Nada mais interessa. Olhe para o seu fora, aquilo que nos aparece. Olhe para o seu dentro, aquilo que é o sumo do que vemos, ainda que não totalizado, mas que pulsa como potência para a realidade.
Isso. Olhe novamente para você, dessa vez com um olhar cerrado, profundo, como quem procuro na extensão do horizonte uma iluminação. É mero detalhe que você esteja lendo essa página porque o que interessa nunca esteve aqui. É de você que falo. É de você que deve escutar a voz.
"Conhece-te a ti mesmo": frase inscrita no pórtico do oráculo de Delfos e que Sócrates entende e introjeta como sua missão. A partir de agora devo conhecer a mim mesmo. Não seria essa a missão de todos? Mas antes de nos analisarmos parece que estamos invocados com os defeitos dos outros. Ah...se fosse fácil mudar a nós mesmos...e nesse nosso hábito de criticar queremos mudar antes o mundo...e esquecemos de nós...Ah...se fosse fácil mudar a nós mesmos...O quanto é que você conseguiu mudar em você, hein?
Mas Sócrates está lá no oráculo para saber se é o homem mais sábio do mundo. E a Pitonisa pergunta: o que você sabe? Sócrates: só sei que nada sei. Pitonisa: és o mais sábio de todos os homens. Primeiro passo: reconhecer a ignorância. Segundo: sabendo algo, que isso é pouco, muito pouco. A partir daí buscar a si mesmo. As duas frases "só sei que nada sei" e "conhece-te a ti mesmo" estão unidas mais do que nunca, como elevação para a busca (de quê?). A verdade. Mas não como lugar último e iluminado onde de lá não se sai e nem quer sair. A verdade como processo e utopia. E uma vez escutei de um uruguaio, que por sua vez escutou de outro, no seguinte diálogo: a utopia serve para quê? Primeiramente, para nada. Mas lembre-se que ela é como o horizonte. Ele está lá. E queremos alcançá-lo, lindo, onde tudo se promete. Mas a cada passo que damos em sua direção ele recua. A cada dez passos mais, mais ele se afasta. O horizonte como verdade em fuga . Mas para quê, então? Para isso, caminhar. E ponto.
Sócrates caminha na sua utopia. E como ele todos os filósofos. Mas o primeiro desafio, antes de construir, é derrubar, destruir. Arrancar do outro que o que se fez dele ainda não é nada. Maior é o que ele pode fazer consigo mesmo. Porque não é de hoje que somos forjados mais com matéria imposta, passivamente ou não, de que com matéria criada e sabida como nossa. Quebra do princípio de originalidade: somos tão pouco nós mesmo. Bem menos do que a gente imagina. Sempre mais históricos, sempre mais hereditários, sempre mais outro que mesmo. Então, Sócrates quebra. E aqueles que se permitem tal desonra do que se é - mas qual eu? - num primeiro passo recua, mas depois avança como nunca. És outro, sendo de ti.
Mas quem hoje se permite abalar as estruturas? Quem é humilde o suficiente para dizer que até hoje não se conhece direito? Quem? Não é de se estranhar que Sócrates fez muitas inimizades, e que por causa dela foi julgado e condenado. Mas quem é que suporta tamanha ironia? Pois o danado do Sócrates sabia das coisas. Claro que sabia, ora bolas. Essa é a sua maior ironia. Mas depois de passada a ironia vem a graça. No momento exato em que o outro se permite ver - no diálogo - de que precisa do outro para saber. Mas de que é capaz, também, por si de ir onde quiser. No diálogo, sempre no diálogo, a filosofia afirma o outro para ser ela mesma. Aprendemos com a filosofia um modo ser. Ela que pretende saber tudo, sabe que não sabe nada. Que tudo ainda é muito pouco. Que sempre nos falta...diálogos do ser...e o homem quando se comunica já precisa do outro, mesmo que para caminhar sozinho, e ser.
Ei. Olhe para essas palavras. Mas olhe para você. E assim vamos, juntos.
Sim, vamos juntos, continuemos juntos!
ResponderExcluirAprendemos com a filosofia um mundo de ser.
Você fala no começo do texto no "fora" e no "dentro". Derrida aponta, no Gramatologia, o papel desses conceitos no surgimento de uma ciência. E diz que Saussure os usou mal para falar da Linguística, ao chamar a linguagem de "dentro" e a escritura de "fora". Derrida desconstrói isso tudo, aliás, Derrida acaba com Saussure, pois, eu tinha entendido o Derrida dizer em outro livro que só desconstrói os autores com quem acha relevante dialogar, talvez pra escrachar o autor mesmo e extrair a sua versão sobre as questões que são tratadas pelo autor. E é isso, o Derrida desmoraliza o pobre do Saussure nesse livro!
Viajei muito e não falei quase nada sobre seu texto, que dialoga com o(a) leitor(a) com leveza
aliás, esse seu texto está uma delícia!
Beijos.
olá, JM, querido conterrâneo!
ResponderExcluirtem razão, tenho escrito muito pouco! estou com um pequeno grande problema que se chama falta de tempo (idéias e inquietações é que não faltam, pode ter certeza). estou no momento do outro lado do mundo, me virando ao avesso pra (sobre)viver por aqui... nesse caso, o trabalho - infelizmente - tem que vir primeiro. e, em segundo, viagens (as físicas, não as da mente). tentarei escrever mais, palavra de escoteira! ;o)
beijos e prazer em conhecer suas palavras, tão filosóficas e profundas, do jeito q gosto!
k.
Adorei, Zé! Vc atinge me cheio a cada dia mais!
ResponderExcluirbeijos.
Zé, li de novo... E hj achei ainda mais brilhante! Vc está pronto, amigo amado. Vc se achou. Vc é isso.
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