quinta-feira, 3 de junho de 2010

7- Um texto para quem precisar

Esse texto nasce com semblante de auto-ajuda ainda que não queira sê-lo. Mas nasce com o intuito de ajudar alguém. Quem? Eu mesmo? Uma amiga minha? Ou alguém que simplesmente o lê e que precise. Ainda que não diga nada de novo. Ainda que diga o que todo mundo sabe. Ele nasce.

E uma revelação me interrompe a escrita: mais importante do que ler é ler o que se precisa na hora certa. De nada adianta ler o melhor romance do ano, o melhor livro da história, ler Clarice Lispector ou Kafka, Marcel Proust ou James Joyce, se a sua alma não pede exatamente aquele material. O sucesso dos livros de auto-ajuda se inserem nesse contexto, ainda que não digam nada de novo, que digam o que todo mundo sabe, eles atingem a pessoa no seu nervo, no exato ponto em que necessitava, ainda que raso, rasteiro, ainda que nada de novo, ainda que nenhuma verdade, nenhuma epifania.

Li grandes livros que me diziam grandes verdades. Porém, em alguns casos, elas não me atingiram como deveriam. E é quando penso que sou um mal leitor. De vez em quando. Quando a pressa me domina, quando a fúria de terminar ultrapassa a fúria de saber e de fruir. Mas, constantemente, não. E mais quando sei que aquilo que estou lendo é aquilo que preciso. O primeiro passo de um grande leitor é saber qual a matéria espiritual que necessita e não lê por modismo ou para se livrar do livro. Mas como saber senão no ato da leitura? Toda leitura é uma aposta. E para além dos livros: toda escolha é uma aposta que só dá a garantia da vitória ou da derrota depois de devorada. Acontece de precisarmos de outra coisa depois que já estamos no meio do caminho de uma leitura onde o diagnóstico da doença foi certeiro? Acontece. Geralmente mudamos de livros. Mas o grande ganho parece ser quando a leitura, depois da excelência da cura, continua a exercer sua influência tenuamente, vagarosamente, no imperceptível. Dando-nos a sensação de que a dor já foi sanada. Mesmo assim, devemos continuar a ler: como um antibiótico que devemos tomar os sete dias depois de já termos curado a nossa dor de garganta. Os meus maiores ganhos aconteceram quando, já depois de terminada a leitura, do livro empoeirado na prateleira, alguma imagem ou verdade me assalta. Ai vi que a leitura foi correta. Quando ela inverteu o jogo e transbordou o tempo.

Não queria dizer nada disso nesse texto. Queria ajudar alguém de outra forma. Dizer o óbvio: que somos energia, que temos de aproveitar o tempo dos nossos átomos se condensaram em nós para existirmos ao máximo. Que depois eles voltam a se embaralhar, a se perder em outros átomos, a fluir a sua energia de outra forma, a voltar para o todo de onde partiu. Mas agora é o nosso tempo: matéria e energia em nós. Porque não celebrarmos isso que somos agora, nesse átimo de tempo de individualidade, para devolvermos ao mundo um pouco dele mesmo, transformado? E aqui me surge a imagem da água-viva (E sim, uma das formas de se entender o romance da Clarice): ela é 90% (ou alguma coisa por ai) feita da mesma matéria do oceano...mas por um segundo ela se desgarra, se condensa...e a sua compleição se difere de tudo o mais...e é nesse espaço que a vemos se movimentar...e é nesse tempo que ela queima...até voltar...até ser novamente água...pura água...Saber sim que somos individuais. Saber sim que somos um sopro de vida. E saber aproveitar isso. E saber também se espalhar e nadar nessa imensidão do mundo. Saber que somos também uma parte do todo e o todo uma parte de nós: água-viva. E vale a dica para, quem precise, ler o romance homônimo da Clarice Lispector.

Bem, ainda que nada de novo. Ainda que nenhuma nova verdade. Um texto para quem precisar.

3 comentários:

  1. Ah, meu amigo, que bom ler você. É isso mesmo. Confesso que ando péssima leitora há anos. Não por más escolhas, mas por não escolhas. Ando sem ler nada. Mas você me deu uma motivação.
    Te amo, beijo

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  2. Toda leitura no fundo é uma auto-ajuada, nãoa cha? No mínino aprendemos a não escrever daquele jeito , do jeito de que não gostamos ou do jeito que não queremos ser.
    Tenho Água viva e amo este livro. Vez em quando, a ele recorro.Frase do meu MSN: "Eu e tu não somos , nós é".C. L.
    Vc escreve bem.Gosto de suas imagens. Bom, agradável de se ler.
    Abraços.

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